quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Articulista global também não vê provas contra Mensalão


Por Lais Amaral

       Para não dizer que estou republicando articulistas 

de esquerda ou coisa parecida, leiam o interessante artigo 

de Paulo Moreira Leite, que é jornalista da Revista  Época, 

das Organizações Globo, e que destoa amplamente das 

matérias veiculadas e repetidas ad nausean nos telejornais globais.  

“Faltou muita coisa” no mensalão

Debora Bergamasco publica uma entrevista muito instrutiva 
com Osmar Serraglio, o deputado que foi relator da CPI 
dos Correios, a primeira em três que investigaram o mensalão.
Serraglio afirma:

“Faltou muita coisa, muito do que eles ficam batendo 
agora que ‘não tá provado isso, não tá provado aquilo’ 
é porque a gente estava amarrado, não tínhamos 
liberdade. Hoje, por exemplo, o José Dirceu fala que 
ele não tem nada a ver com isso. 


Nós poderíamos ter feito provas muito mais contundentes 
em relação à evidente ascendência que ele tinha”, diz Serraglio.

Ele também diz que na CPI os petistas agiam para 
dirigir as investigações para o terreno em que lhes 
interessava. Por exemplo: pressionavam para que se 
procurasse pela origem do dinheiro que Delúbio Soares 
e Marcos Valério distribuíam e não pelo seu destino.

O depoimento é instrutivo pelo que diz e também pelo 
que dá a entender. Ao admitir que “faltou muita 
coisa” o deputado reconhece que  apesar de todo 
o esforço realizado na época, não se conseguiu avançar 
na produção de provas contra Dirceu e outros acusados.

O argumento de que a liderança política de Dirceu 
atrapalhou a investigação faz sentido. Também 
acredito que os deputados da bancada governista 
não ajudaram a investigar seu próprio governo.  


Mas  eu acho que isso sempre faz parte do jogo 
em toda CPI, desde a Idade das Cavernas, não é mesmo?

Seja pelo motivo que for, a alegação de Serraglio 
coloca um problema para a acusação. Equivale ao 
reconhecimento de que tem dificuldade para apresentar 
provas para o julgamento.


Essa avaliação não é nova.

Num texto que publiquei aqui, semanas atrás, dizia 
que a tese principal do mensalão, como um sistema 
de compra de votos no Congresso, não estava 
demonstrado no inquérito da Polícia Federal sobre o caso.


Não fui o primeiro a sustentar isso. O jornalista Lucas 
Figueiredo, autor de O Operador, sobre Marcos Valério, 
que fez várias revelações importantes sobre o caso, mostra que o mensalão “não foi provado”—Lucas já dizia isso em 2006.

Jânio de Freitas, um dos grandes mestres do jornalismo,  
escreveu na segunda-feira que é possível sustentar 
que Dirceu é o chefe do mensalão com a mesma 
consistência que se poderia dizer que o chefe era 
Antonio Palocci, pois não há prova alguma contra nenhum 
dos dois neste caso.


Esta é a questão. Muito do que se disse não 
se provou. Por que?

Se você conversar com a bancada do PT, irá concluir que 
não se provou porque não havia o que deveria ser provado. 
O mensalão era o nome para os conhecidos esquemas 
de financiamento de campanhas eleitorais.

Mas há explicações técnicas que ajudam a entender 
porque as investigações não avançaram mais, evitando 
a constatação de que faltou muita coisa,” como diz Serraglio.

Uma observação possível  é que faltou um acordo para 
a delação premiada. Roberto Jefferson deu grandes 
entrevistas e fez ótimos discursos, mas, como disse 
Fernando Henrique Cardoso, ele “teatralizou o mensalão.”

Um delegado me assegura que tudo teria sido muito 
diferente se Marcos Valério, em vez de perseguido de 
modo implacável, tivesse recebido a oferta de salvar 
a própria pele na hora certa – e passado a agir como aliado das investigações, em vez de proteger-se como acusado.

O que ele poderia contar? Aquilo que a oposição espera? 
Aquilo que o governo sustenta? Não se sabe. Seja como for, 
é tarde demais.

O Supremo irá julgar o mensalão com aquilo que está nos 
autos. Será um julgamento técnico e político.


Técnico, porque não se trata de uma corte de aloprados. 
E político, porque o STF tem a função de defender a 
Constituição – e essa missão é política.

Quando se fala no aspecto político,  pode-se pensar 
em várias hipóteses. Uma delas, a que parece mais óbvia, 
seria atender a um clamor  contra a corrupção e contra 
a impunidade.

Mas também é uma atitude política considerar que, 
apesar deste clamor, convém afirmar outro valor, 
de que é preciso julgar com isenção, a partir de provas 
claras e bem fundamentadas. Este é o debate real 
no julgamento.

Leia meu artigo anterior sobre o mensalão:

http://colunas.revistaepoca.globo.com/paulomoreiraleite
/2012/05/30/verdades-incomodas-sobre-o-mensalao/