"A imprensa pode causar mais danos que a bomba atômica. E deixar cicatrizes no cérebro." Noam Chomsky.
“Com o tempo, uma imprensa cínica, demagógica e corrupta formará um público tão vil quanto ela mesma”. Joseph Pulitzer, jornalista (há mais de um século).
"A imprensa deixou há muito de informar, para apenas seduzir, agredir e manipular." Prof. Andrew Oitke, catedrático de Antropologia em Harvard.
"Saber não basta, carece corromper, comprometer e ameaçar o que existe" Paulo Leminski
Por Lais Amaral
Tem muita coisa que sai do seu aparelho de TV que deveria ir direto para o lixo. Mas não vai. Vai para os arquivos de memória do cidadão e servirá de alimento para as suas deduções. Uma sensação de informação definitiva o invadirá. Esse é o problema do quase-monopólio das comunicações em nosso país. A linguagem e o pensamento únicos.
Meu Blog passou por problemas técnicos e fiquei fora do ar por algum tempo, mas estamos de volta com essa oportuna matéria do Miguel do Rosário, do Blog "O Cafezinho". Só pra se conhecer o outro lado do noticiário contra um dos condenados da Ação Penal 470 (Mensalão), o ex-funcionário do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, que fugiu para a Itália. O texto vai enriquecer o arsenal de informações do leitor com um material mais diversificado.
Enviado por Miguel do Rosário
do Blog O
Cafezinho em 17/02/2014
A grande mídia continua fazendo um excelente trabalho de contra-informação
quando o assunto é Henrique Pizzolato e mensalão. Os leitores têm de tomar
muito cuidado. O mensalão sempre foi uma operação eminentemente midiática. E
continua sendo. Os mesmos grupos que fizeram o que fizeram, não só durante o
julgamento da Ação Penal 470, mas antes, durante a montagem da peça de
acusação, continuam agindo. Eles vão usar todas as suas armas agora para
desmoralizar Pizzolato porque entendem que isso será necessário para minimizar
os contra-ataques que podem vir da Justiça italiana.
Diariamente os jornais trazem
notícias pretensamente “bombásticas” sobre Pizzolato. O importante é
desconstruir, ao máximo, a sua figura, e criar uma agenda negativa para se
contrapor à campanha de solidariedade aos réus petistas que vem constrangendo
profundamente a mídia.
Matéria do Globo hoje,
por exemplo, desinforma muito mais do que qualquer outra coisa. O subtítulo é
genial: “Extratos encontrados na Itália apontam operações em muitos países
europeus”. Qual a intenção agora? Pintar Pizzolato como um grande criminoso
internacional, chefe das máfias em vários lugares do mundo?
O que há de concreto sobre o fugitivo
é o seguinte:
1 – Sua fuga foi completamente
atabalhoada. Apesar de, supostamente, tê-la planejado desde 2008, quando
renovou os documentos do irmão, Pizzolato fugiu pela Argentina usando o cartão
de crédito da própria mulher. O fato de usar os documentos do irmão também não
pressupõe nenhuma sofisticada mente criminosa. Não quero justificar, mas temos
que manter as proporções. Tudo que Pizzolato fez se deu após a constatação de que
a guilhotina de uma Justiça falsa iria desabar fatalmente sobre seu pescoço.
2 – Pizzolato foi preso na casa de
seu sobrinho, e todo mundo sabia que ele tinha um sobrinho na Itália, o que
mostra uma total falta de cuidado. Parecia que Pizzolato queria ser pego. Ao
apresentar os documentos de seu irmão à polícia, Pizzolato também se mostrou
uma pessoa completamente despreparada. É o anti-criminoso por excelência. É
prova também que não havia “nenhum grupo forte” por trás de Pizzolato, conforme
se aventou meses atrás. Até agora tem sido defendido por um advogado indicado
pela polícia, ou seja, se não é um advogado público ou gratuito, é o mais
barato possível. Aliás, espero que seja um bom advogado, ou então que Pizzolato
tenha condições de contratar o melhor advogado criminal possível.
3 – Ele ficou no Brasil até o último
dia possível, trabalhando 24 horas em sua defesa. Não se escondeu. Foi a
diversos eventos do PT onde explicava o que acontecia. Fazia reuniões com
jornalistas, militantes, curiosos, tentando mostrar a sua versão dos fatos. Não
era, nem de longe, o comportamento de um criminoso. Sempre teve o comportamento
de um cidadão angustiado para provar sua inocência.
4 – Até agora, a polícia italiana,
encontrou extratos que falam de somente de 30 mil euros, quantia irrisória para
um alto executivo do Banco do Brasil e sua esposa arquiteta. No entanto, é
possível que Pizzolato tenha mais dinheiro guardado, dinheiro seu, próprio,
acumulado em mais de 40 anos de trabalho, conforme explicarei mais abaixo.
5 – A matéria do Globo fala de contas
em “vários países”. No subtítulo, troca-se “vários” por “muitos”. Uma mudança
sutil, mas importante e maliciosa. A única informação concreta da polícia
italiana é que Pizzolato e sua esposa tinham contas na Espanha. Pizzolato
praticamente morou na Espanha entre 2006 e setembro 2012. Se quisesse fugir,
aliás, teria fugido nesse período. Provavelmente abriu uma ou mais contas na
Espanha nessa época. Quando fugiu, deve ter raspado todo o dinheiro que
possuía. Daí as “várias operações”.
6 – A irmã de Pizzolato era (ainda é,
pelo que eu sei) diarista em hospital e casas de famílias há muitos anos na
Espanha. Pizzolato a ajudava financeiramente sempre que podia, e também a
ajudou a resolver alguns problemas familiares que aconteceram por lá nos
últimos anos.
7 – Até o momento, portanto,
Pizzolato tinha contas na Espanha, onde sua irmã residia, e na Itália, onde
mora desde que para lá fugiu. Os “muitos países” do subtítulo, até o momento,
são apenas dois, com explicações concretas para tal.
8 – Reproduzo abaixo um comentário
que publiquei, há alguns dias, como resposta a um internauta que me fez
perguntas sobre a tal conta na Suíça de Pizzolato, sobre a qual não há, até o
momento, nenhum rastro.
“Não sei, Luis. Pode ser mentira, pode
ser uma verdade mal contada. Também desencanei dessa história. O fogo é saber
que a mídia jamais vai querer explicar as coisas direito. Sempre haverá essa
terrível má-intenção deliberada, que é uma coisa sinistra nessa história do
mensalão. O interesse político está muito acima do interesse pela verdade.
Pizzolato é hoje o brasileiro com a
vida mais devassada do mundo. Não conheço tanto assim o Pizzolato, mas pelo
descobri, dele mesmo e de terceiros, ele vendeu tudo que tinha e deu pra
mulher. Pizzolato não era pobre. Algumas vezes eu uso demais a mim mesmo como
referência e acabo esquecendo que nem todo mundo é duro. Ele era de família
tradicional do Paraná, de imigrantes trabalhadores e poupadores como ainda
vemos no interior do sul do país. Começou a trabalhar muito cedo no Banco do
Brasil e se tornou graduado por eleições internas. Foi o primeiro sindicalista
eleito pelos próprios funcionários. Antes, só os funcionários indicados pelo
alto galgavam postos na empresa. Um amigo dele me contou que Pizzolato era um
dos raros funcionários do BB que nunca usou cheque especial. Ele e a esposa
sempre foram muito disciplinados com dinheiro. A esposa era arquiteta e fazia
projetos. Em 30 ou 40 anos de Banco do Brasil, ele morou em umas 10 cidades, em
todas sempre adquiria a casa ou apartamento onde residiu. Sem contar que
Pizzolato trabalhou por bastante tempo no Conselho da Previ (sempre indicado
democraticamente pelos funcionários), e ganhava muito bem por essa função.
Uma jornalista do Correio Braziliense
descobriu e publicou reportagem há alguns dias trazendo todos os dados fiscais
de Pizzolato até 2005. No imposto de renda, ele tinha cerca de dez imóveis,
todos adquiridos antes do governo Lula. Parece que tinha uma bela casa de praia
em camboriu, Santa Catarina. Esse imóveis eram avaliados pela receita, em
números não atualizados, em 2 milhões de reais. Com o preço desses imóveis
atualizados, esse valor pode dobrar ou triplicar. Ou quadruplicar, sei lá.
Se ele mandou esse dinheiro para o
exterior, não sei. Pizzolato já sabia que estava lascado. O caso dele,
juridicamente, é o mais difícil de virar, porque ele foi condenado por todos,
até mesmo pelo Lewandoswki, que embarcou na onda do Visanet.
Se tudo que eu penso que aconteceu,
realmente aconteceu, se Pizzolato foi vítima de uma armação jurídica, então eu
serei o último a culpá-lo por planejar sua fuga, que naturalmente envolve
segurança financeira no lugar para onde você vai. Eu nunca recriminarei a busca
pela liberdade. Se um indivíduo acredita realmente na sua inocência, ele tem
todo o direito de fugir, se achar que é a única saída que possui para continuar
lutando por sua dignidade.”
9 – A campanha de solidariedade aos
petistas tem um limite. Ela representa uma postura de enfrentamento. Mas um
enfrentamento (paradoxalmente) passivo, quase desesperado, estéril. A
verdadeira luta contra as arbitrariedades da Ação Penal 470 se dá no debate
sobre o mérito das acusações. E aí é que Pizzolato constitui uma figura
central, porque a sua condenação se deu contra as provas. Pizzolato tinha
provas de que ele não era responsável pelo Visanet, que o Visanet era 100%
privado, e que não foi desviado. Mais ainda, Pizzolato foi o réu mais
prejudicado pela ocultação de provas feita por Joaquim Barbosa. O laudo 2828
foi escondido. O inquérito 2474 foi escondido. Tudo isso prejudicou
profundamente a defesa de Pizzolato e outros réus. Além disso, Pizzolato não
era parlamentar, nunca foi, e foi julgado diretamente no STF, sem direito a um
segundo grau de jurisdição, contrariando a Constituição e os tratados
internacionais de direitos humanos assinados pelo Brasil. Outros réus foram
vítimas da mesma arbitrariedade, já que apenas dois ou três, de um total de 39,
tinham mandato parlamentar.
10 – Pizzolato foi vítima ainda da
estratégia de “fatiamento”, essa jogada de gênio (do mal) de Barbosa, feita em
cima da hora, pegando de surpresa até mesmo o relator do processo, Lewandowski.
A estratégia forçou os réus, seus advogados e a militância a se aferrarem aos
casos individuais, ao invés de discutir o todo, o mérito de todo o processo.
Com isso, os réus se isolaram em suas próprias defesas. Os militantes e amigos
de Dirceu se apegaram somente a seu caso, e assim por diante. Pizzolato, que
nunca fez parte de nenhuma corrente do PT, ficou totalmente isolado, só com um
ou dois amigos a seu redor. O caso Pizzolato só irá ganhar notoriedade junto a
seu próprio campo após as reportagens de Raimundo Pereira na Retrato do Brasil.
Mas aí já era tarde demais.
11 – Não sei que espécie de
inteligência esteve por trás de tantas maquinações. Mas sei que houve
maquinação. Conversando com um deputado federal que viveu intensamente aqueles
primeiros anos do mensalão, ele me contou algumas coisas interessantes. Ele me
contou, por exemplo, que o então presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, foi
convidado a ir a São Paulo por um grupo de empresários. Lá, fizeram-lhe uma
proposta. Que ele renunciasse à presidência. Em seu lugar, entraria o deptuado
Thomaz Nonô, do então PFL-AL, o qual aceitaria o pedido de impeachment do
presidente Lula. Mesmo que o Congresso não aceitasse, o pedido serviria para
desgastar politicamente o presidente. Cavalcanti não aceitou, em nome da
afinidade que sentia com um homem de sua própria terra, vindo da mesmas origens
populares como ele próprio. O que pode ter salvado o país, portanto, foi a
velha honra pernambucana.
12 – O mesmo deputado (o que
conversava comigo, não o Severino) fez a seguinte avaliação de conjuntura. “Não
sei quem esteve por detrás disso, Miguel, mas eles tiveram sucesso em sua
estratégia: que era evitar a construção de uma hegemonia de esquerda no
parlmento, sobretudo do Partido dos Trabalhadores. Não fosse o mensalão, o PT
elegeria mais deputados. Não haveria a cisão que criou o PSOL. E o governo
ficaria menos dependente de acordos com a direita para garantir a
governabilidade.”
13 – Eu complementei e o deputado
concordou: “Naquela época, Dirceu vinha dando entrevistas fazendo uma defesa da
união da América do Sul. Lembro-me de uma entrevista que Dirceu falou inclusive
da criação de uma moeda única para todo o continente. Falou em instituir
espanhol nas escolas públicas. Isso com certeza apavorou alguns poderosos lá do
norte.”
14 – Eu continuei, ainda com anuência
do parlamentar: “Apesar de ser considerado, dentro do PT, representante de uma
vertente mais conservadora, Dirceu era o quadro mais temido pela direita, por
causa de seu entendimento sobre a conjuntura global. Dirceu era o quadro
intelectualmente mais bem preparado do Partido dos Trabalhadores, e seria um
perigo que ele ganhasse a presidência, porque poderia iniciar ações concretas
para realizar o seu objetivo de unir a América do Sul num só bloco político e
econômico.”
15 – Tenho mais documentos e informações sobre o caso Pizzolato, que
destróiem mais ainda a farsa. Mas antes de entrar nessa seara, eu precisava
fazer uma marcação política, quase semiótica, sobre o caso. Volto ao assunto em
breve.