 |
Lula, agora também é colunista do NYT |
Por Laís
Amaral
Este blog andou meio ‘paradão’ nos últimos meses por motivos
particulares. Andei atarefado com estudos, trabalho e problemas com meu PC.
Retorno que esse artigo do Lula (agora colunista do The New York Times) avaliando o movimento recente das ruas.
The New York Times
Novas vozes no Brasil
Luiz Inácio Lula da Silva
A
juventude, conectada nas redes sociais e com os dedos ágeis em seus celulares,
tem saído às ruas para protestar em diversas regiões do mundo.
Parecia mais fácil explicar as razões de tais
protestos quando eles aconteciam em países sem democracia, como o Egito e a
Tunísia em 2011, ou onde a crise econômica levou o desemprego juvenil a níveis
assustadores, como na Espanha e na Grécia, por exemplo.
Mas a chegada dessa onda a países com governos democráticos e populares,
como o Brasil, quando temos as menores taxas de desemprego da nossa história e
uma inédita expansão dos direitos econômicos e sociais, exige de todos nós,
líderes políticos, uma reflexão mais profunda.
Muitos acham que esses movimentos significam a
negação da política. Eu acho que é justamente o contrario: eles indicam a
necessidade de se ampliar ainda mais a democracia e a participação cidadã. De
renovar a política, aproximando-a das pessoas e de suas aspirações cotidianas.
Eu só posso falar com mais propriedade sobre o
Brasil. Há uma ávida nova geração em meu país, e eu creio que os movimentos
recentes são, em larga medida, resultado das conquistas sociais, econômicas e
políticas obtidas nos últimos anos.
O Brasil conseguiu na última década mais que dobrar o número de
estudantes universitários, muitos deles vindos de famílias pobres. Reduzimos
fortemente a pobreza e a desigualdade. São grandes feitos, mas é também
absolutamente natural que os jovens, especialmente aqueles que estão obtendo o
que seus pais nunca tiveram, desejem mais.
Estes
jovens tinham 8, 10,12 anos quando o partido que eu ajudei a criar, o PT, junto
com seus aliados, chegou ao poder. Não viveram a repressão da ditadura nos anos
60 e 70.
Não viveram a inflação dos anos 80, quando a primeira coisa que fazíamos
ao receber um salário era correr para um supermercado e comprar tudo o que
fosse possível antes que os preços subissem no dia seguinte. Também tem poucas
lembranças dos anos 90, quando a estagnação e o desemprego deprimiam o nosso
país.
Eles querem mais. E é compreensível que seja assim. Tiveram acesso ao ensino
superior, e agora querem empregos qualificados, onde possam aplicar o que
aprenderam nas universidades.
Passaram a contar com serviços públicos de que antes não dispunham, e
agora querem melhorar a sua qualidade. Milhões de brasileiros, inclusive das
classes populares, puderam comprar o seu primeiro carro e hoje também viajam de
avião.
A contrapartida, no entanto, deve ser um transporte público eficiente e
digno, que facilite a mobilidade urbana, tornando menos penosa e estressante a
vida nas grandes cidades.
Os anseios dos jovens, por outro lado, não são
apenas materiais. Também querem maior acesso ao lazer e à cultura. E,
sobretudo, reclamam instituições políticas mais transparentes e limpas, sem as
distorções do anacrônico sistema partidário e eleitoral brasileiro, que até
hoje não se conseguiu reformar.
É impossível negar a legitimidade de tais demandas, mesmo que não seja
viável atendê-las todas de imediato. É preciso encontrar fontes de
financiamento, estabelecer metas e planejar como elas serão gradativamente
alcançadas.
A
democracia não é um pacto de silêncio. É a sociedade em movimento, discutindo e
definindo suas prioridades e desafios, almejando sempre novas conquistas. E a
minha fé é que somente na democracia, com muito dialogo e construção coletiva,
esses objetivos podem ser alcançados.
Só na democracia um índio poderia ser eleito Presidente da Bolívia, e um
negro Presidente dos Estados Unidos. Só na democracia um operário e uma mulher
poderiam tornar-se Presidentes do Brasil.
A
história mostra que, sempre que se negou a política e os partidos, e se buscou
uma solução de força, os resultados foram desastrosos: guerras, ditaduras e
perseguições de minorias. Todos sabemos que, sem partidos, não pode haver
verdadeira democracia.
Mas cada vez fica mais evidente que as nossas populações não querem
apenas votar de quatro em quatro anos, delegando o seu destino aos governantes.
Querem interagir no dia a dia com os governos, tanto locais quanto nacionais,
participando da definição das políticas públicas, opinando sobre as principais
decisões que lhes dizem respeito.
Em suma: não querem apenas votar, querem ser
ouvidas. E isso constitui um tremendo desafio para os partidos e os lideres
políticos.
Supõe ampliar as formas de escuta e de consulta, e os partidos
precisam dialogar permanentemente com a sociedade, nas redes e nas ruas, nos
locais de trabalho e de estudo, reforçando a sua interlocução com as
organizações dos trabalhadores, as entidades civis, os intelectuais e os dirigentes
comunitários, mas também com os setores ditos desorganizados, que nem por isso
tem carências e desejos menos respeitáveis.
E não só em períodos eleitorais. Já se disse, e
com razão, que a sociedade entrou na era digital e a política permaneceu analógica.
Se as instituições democráticas souberem utilizar criativamente as novas
tecnologias de comunicação, como instrumentos de dialogo e participação, e não
de mera propaganda, poderão oxigenar – e muito – o seu funcionamento,
sintonizando-se de modo mais efetivo com a juventude e todos os setores
sociais.
No caso do PT, que tanto contribuiu para
modernizar e democratizar a política brasileira e que há dez anos governa o meu
país, estou convencido de que ele também precisa renovar-se profundamente, recuperando
seu vinculo cotidiano com os movimentos sociais. Dando respostas novas a
problemas novos. E sem tratar os jovens com paternalismo.
A boa
noticia é que os jovens não são conformistas, apáticos, indiferentes à vida
pública. Mesmo aqueles que hoje acham que odeiam a política, estão começando a
fazer política muito antes do que eu comecei.
Na idade deles, não imaginava tornar-me um militante político.
E
acabamos criando um partido, quando descobrimos que no Congresso Nacional
praticamente não havia representantes dos trabalhadores. Inicialmente não
pensava em me candidatar a nada. E terminei sendo Presidente da República.
Conseguimos, pela política, reconquistar a democracia, consolidar a
estabilidade econômica, retomar o crescimento, criar milhões de novos empregos
e reduzir a desigualdade no meu país. Mas claro que ainda há muito a ser feito.
E que bom que os jovens queiram lutar para que a mudança social continue e num
ritmo mais intenso.
Outra
boa notícia é que a Presidente Dilma Rousseff soube ouvir a voz das ruas e deu
respostas corajosas e inovadoras aos seus anseios. Propôs, antes de mais nada,
a convocação de um plebiscito popular para fazer a tão necessária reforma
política.
E lançou um pacto nacional pela educação, a saúde e o transporte
público, no qual o governo federal dará grande apoio financeiro e técnico aos
estados e municípios.
Quando
falo com a juventude brasileira e de outros países, costumo dizer a cada jovem:
mesmo quando você estiver irritado com a situação da sua cidade, do seu estado,
do seu país, desanimado de tudo e de todos, não negue a política.
Ao contrário,
participe! Porque o político que você deseja, se não estiver nos outros, pode
estar dentro de você.