Por Marcos Coimbra
Ao contrário do que alguns
temiam e outros desejavam, as eleições municipais estão entrando no último mês
de campanha sem que sejam discerníveis efeitos do julgamento do “mensalão” em
seu andamento.
O que já se esperava.
Em nossa história moderna,
nenhuma eleição local foi significativamente afetada por acontecimentos
nacionais, mesmo quando foram relevantes. Veja-se o que ocorreu em 1992, quando
o eleitorado foi às urnas dias após o impeachment de Fernando Collor.
Aquele, que foi o mais
traumático evento de nossa evolução política recente e o que mais mobilizou os
sentimentos da população, em nada modificou os resultados esperados da eleição.
Ganhou quem tinha que ganhar, perdeu quem estava fadado a ser derrotado.
No máximo, a turbulência
engrossou o contingente dos deputados dispostos a condenar o ex-presidente na
votação na Câmara, pois os que disputavam mandatos não quiseram aparecer na
televisão o absolvendo, na contra-mão dos sentimentos populares. O que teve, no
entanto, pequeno impacto no resultado.
A única eleição que foge à
regra ajuda a entendê-la. Foi em 1985, quando, uma semana antes da eleição,
morreram três pessoas em Volta Redonda pela ação de tropas do Exército, que
dispersaram a bala uma manifestação dos operários da Companhia Siderúrgica
Nacional.
Nos dias seguintes ao tiroteio,
todas as pesquisas mostraram o rápido crescimento dos candidatos de esquerda.
Era uma eleição especial - restrita às capitais e outras cidades que os
militares consideravam de “segurança nacional” -, mas o sentimento se espalhou
por todo o país.
Há quem explique a derrota de
Fernando Henrique para Jânio Quadros, em São Paulo, pela performance inesperada
de Eduardo Suplicy, assim como a arrancada do PT em Belo Horizonte, com
Virgílio Guimarães, em função desse fator.
O certo é que o PT ganhou sua
primeira eleição municipal em uma capital, elegendo a prefeita de Fortaleza,
Maria Luíza Fontenelle, e contrariando todas as expectativas.
E hoje?
Se os eleitores foram votar em
1992 três dias depois do impeachment e já o tinham superado, se o sistema
político amadureceu 27 anos depois de 1985, por que imaginar que o “julgamento
do mensalão” viraria as eleições deste ano de ponta cabeça?
Nem às custas do enorme espaço
que recebe na cobertura dos veículos ligados aos grandes grupos da indústria de
comunicação. Apesar de seu esforço, a vasta maioria da opinião pública
permanece distante e desatenta ao que se passa em Brasília.
Para ela, o “mensalão” é apenas
mais um episódio, entre centenas, dos casos de irregularidades, corrupção,
confusões e complicações que caracterizam o cotidiano da política brasileira.
Nem mais grave, nem maior que outros.
No que tem razão.
Considerando as cidades para as
quais dispomos de dados, não parece haver sequer uma em que o “mensalão” esteja
sendo discutido pelo eleitorado como algo relevante na decisão a respeito do
melhor candidato a prefeito. O julgamento não entrou na agenda da eleição -
pelo menos, por enquanto.
Nada mais natural que os
candidatos do PT não queriam discuti-lo, mas por que os candidatos da oposição
não tocam no assunto na propaganda eleitoral? Talvez por saber que pouco
interessa ao eleitor, que espera vê-los discutindo as cidades e apresentando
propostas.
Neste final de agosto, poucas
mudanças significativas ocorreram nas intenções de voto nas grandes cidades.
Quase nada mudou em relação a
julho.
Curiosamente, a única se deu no
sentido inverso ao que se imaginava.
Até agora, é tucana a maior
vítima destes tempos dominados pela obsessão da mídia com o julgamento. Em São
Paulo, José Serra enfrenta o mais sofrido inferno astral de sua carreira.
Mas não é por causa do
“mensalão”.
Marcos
Coimbra é
sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi